domingo, 21 de agosto de 2011

A Pemba, a Lei de Pemba e o Ponto Riscado



Por: Gregorio Lucio
A Pemba

A Pemba é um elemento ritual muito característico e presente nos terreiros de Umbanda.

Pemba
Como mostra a figura ao lado, trata-se de um giz rústico, constituído de calcário.

Esse elemento é amplamente utilizado nos rituais africanos, e obviamente, herdamos desta cultura religiosa tal prática.

A Pemba geralmente é utilizada de duas formas específicas nos ritos: em pó ou em forma de pedra.

A origem do nome, Pemba, vem da lenda africana referente ao monte Kabanda e as águas do rio Usil (tidos como sagrados pelas tribos Bacongo e Congo). A lenda conta a história da donzela M.Pemba, virgem filha do poderoso líder de sua tribo, Soba Li-u-Thab. M.Pemba seria conservada virgem para que fosse oferecida às divindades cultuadas por aquela tribo, no entanto, a jovem conhece um estrangeiro, e ambos entregam-se a uma aventura amorosa, tomados pela paixão.

O pai de M.Pemba, quando toma conhecimento de tal aventura amorosa, manda degolar o rapaz para que em seguida fosse lançado ao rio USIL, de maneira que fosse devorado pelos crocodilos. M.Pemba, consternada com tal tragédia e desilusão amorosa, para atestar sua dor e pesar, cobria todo o seu corpo com o pó branco retirado do monte Kabanda e à noite, para que seu pai não soubesse desse ato de dor perante a morte de seu amor, lavava-se nas margens do rio. 

Um dia, pessoas da tribo que observavam M.Pemba banhar-se, viram que a jovem elevava-se aos céus, deixando em seu lugar um monte de massa branca às margens do rio. Ao informarem o pai, Soba, enfurecido, mandou que também degolassem aos membros da tribo. No entanto, como estes haviam passado em seu corpo aquela massa branca deixada pela jovem "divinizada", perceberam que o tirano líder acalmava-se e tornava-se bom, desculpando os seus servos.

A partir daí, a Pemba vem sendo utilizada dentro dos ritos africanos.

A Lei de Pemba.

O termo refere-se ao domínio da mística simbólica, realizada e transmitida pelos guias de Umbanda, cujos seus maiores conhecedores e guardiões de seu segredo são os nossos Pretos-Velhos.

A Lei de Pemba é expressa pela utilização de símbolos cabalísticos de origem universal, presentes em todas as culturas ao longo da história da Humanidade, os quais ganham re-significação própria dentro da rito-liturgia umbandista.

A Lei de Pemba contém em si aspectos fundamentais do conhecimento transcendente a respeito das Leis Espirituais que regem os movimentos das consciências viventes no planeta Terra, bem como as vinculações de ordem kármica entre estas e os mecanismos pelos quais a vontade humana pode subordinar forças sutis e naturais, movimentando-as, com a intenção de produzir efeitos que impactem nas dimensões material e espiritual.

Sendo assim, a Lei de Pemba manifesta as chaves para o conhecimento dos atributos e vinculações das Entidades Espirituais dentro das Leis de Umbanda, assim como guarda para si aspectos mais profundos que não podem ser acessados diretamente por pessoas (encarnadas) e mesmo entidades espirituais que ainda não possuam níveis de conhecimento e de consciência próprios para tal.


Como dissemos, as Entidades Espirituais ligadas à Corrente Umbandista, trazem os conhecimentos, em maior ou menor grau, referentes à Lei de Pemba e para que possam grafá-los, "abrindo-os" para a dimensão material, utilizam-se de símbolos próprios da cultura humana, os quais encontram-se gravados no inconsciente do médium e em si próprios. Para isso, dentro da cultura umbandista, damos significados próprios a tais simbologias, contextualizando-os de acordo com nosso universo simbólico-espiritual.

De acordo com Evans-Pritchard (2004), conforme consta em Etiene Sales (2005), o símbolo religioso é uma representação analógica do mundo invisível, sendo a cultura a matriz geradora das formas simbólicas que trazem à existência (mundo imanente) forças do mundo espiritual.

Pelo exposto acima, vemos que a Espiritualidade irá utilizar-se daqueles símbolos subjacentes no inconsciente do indivíduo, portanto dotados de grande força emocional e transcendente, para imprimir as "ordens" e "movimentos" que facultarão a obtenção de determinados efeitos sobre o ambiente, sobre a coletividade presente ao rito, sobre o médium ou o consulente, sobre um espírito desencarnado ou um doente necessitado de ajuda, etc...

Depreendemos então que a Lei de Pemba, num nível mais fundamental, é utilizada para a criação de concentrações de forças que serão postas em movimento para beneficiar os presentes ao rito.

Assim, a Lei de Pemba consubstancia-se, dentro da prática rito-litúrgica umbandista, por meio do Ponto Riscado.

Ponto Riscado

Segundo as Hierarquias Espirituais regentes das Leis de Umbanda, os espíritos ligados à Corrente Astral afim à nossa faixa espiritual religiosa, estão agrupados em 3 categorias distintas, quais sejam:
Orixás, Guias e Protetores (trataremos em artigos futuros de maneira mais detalhada a respeito das Hierarquias Espirituais da Umbanda).

Ponto Riscado na tradição esotérica da Umbanda
Essa categorização evidencia uma qualificação em termos de evolução espiritual para os espíritos trabalhadores da Umbanda.

Pela Lei de Afinidade, estes espíritos irão utilizar-se de médiuns compatíveis com seus propósitos e alcances de trabalho. De maneira geral, os espíritos identificados com o trabalho mediúnico estão entre aqueles na condição de Guias e Protetores.

Conforme havíamos dito, a Lei de Pemba contém em si uma série de aspectos profundos da realidade espiritual, e por conta disso, seu acesso não é dado de maneira integral a todos os Espíritos e médiuns. O patamar de conhecimento e possibilidades de compreensão a respeito da utilização da grafia  cabalística umbandista, está diretamente relacionado ao grau de consciência manifestados pelo Espírito atuante e o seu respectivo médium.

Dessa forma é que veremos Pontos Riscados que meramente trazem informações a respeito da Entidade manifestada naquele momento, qual a sua pertença espiritual e ordens de trabalho. Ou seja, pelos símbolos contidos no Ponto Riscado, podemos identificar qual a Linha, Falange e Cruzamento (se for o caso) do Guia ou Protetor. Aliás, justamente, o que irá categorizar um espírito na condição de Guia ou Protetor é exatamente a simbologia e interpretação expressa no Ponto Riscado.

Resumindo, pelo Ponto Riscado a entidade poderá dizer quem é, qual a sua linha e, qual seu grau dentro da hierarquia espiritual. O Ponto Riscado é a assinatura da Entidade Espiritual.

Adicionalmente, o Ponto Riscado é utilizado não somente para identificação dos Espíritos como também para beneficiar determinadas pessoas (física ou espiritualmente) e para a consagração de guias, patuás, elementos rituais (pembas, instrumentos da curimba, fitas, velas, imagens, etc).

Não podemos deixar de considerar, quanto à interpretação e significado dos símbolos usados nos Pontos Riscados, ser imprescindível levar em conta o contexto cultural e tradicional do templo umbandista onde serão expressos e manifestos. Isso por que, segundo Sales (2005): "O significado de um símbolo não é intrinseco mas depende do discurso em que encontra inserido em sua própria estrutura. Fora do contexto onde foram gerados, os significados dos símbolos se alteram[...]. É preciso perceber a dinâmica própria  da cultura religiosa do local e sua influência nas simbologias e representações".

Compreendemos então que os Pontos Riscados não são símbolos universais (embora os elementos contidos neles sejam) e sua linguagem expressa um padrão dinâmico que carece ser interpretado dentro do contexto religioso de cada casa de Umbanda.

Sendo assim, esperamos ter contribuído um pouco com o esclarecimento a respeito destes aspectos tão presentes na nossa vivência umbandista.

Que Oxalá abençoe-nos!

Saravá!

Bibliografia Consultada:

Itaoman, Mestre (1990). Pemba e Grafia Sagrada dos Orixás
Rivas Neto, Francisco (2002). Umbanda a Proto-Síntese Cósmica
Matta e Silva, .W.W da (2010). Lições de Umbanda (e quimbanda) na palavra de um preto-velho
___________________ (2009). Doutrina Secreta de Umbanda
___________________ (2010). Umbanda e o Poder da Mediunidade
___________________ (2010). Umbanda de Todos Nós.
___________________ (2009) Mistérios e Práticas na Lei de Umbanda
Saraceni, Rubens (2007). O Código da Escrita Mágica Simbólica
Jung, C.G (1950). O Simbolismo da Mandala
Chiesa, Gustavo Ruiz (2011). A Magia na Umbanda (artigo cientfíco)
__________________ (2010). A Umbanda e as Coisas: Cosmologia e Materialidade na experiência religiosa (artigo científico)
Souza, Mônica Dias (2006). Pretos-Velhos: Oráculos, crença e magia entre os cariocas (tese de doutorado).
Oliveira, Etiene Sales de (2005). Umbanda de Pretos-Velhos: Tradição Popular de uma Religião (tese de mestrado)

Nenhum comentário:

Postar um comentário